Doença Celíaca no Adulto
A Doença Celíaca no Adulto é mais comum do que se julga: Quando suspeitar e como actuar
Introdução
A doença celíaca (DC) é uma enteropatia reactiva ao glúten, de origem auto-imune, caracterizada por inflamação e atrofia das vilosidades da mucosa do intestino delgado proximal, prejudicando a absorção dos nutrientes e gerando problemas decorrentes de autoagressão local e sistémica. Tem uma base genética, afectando indivíduos portadores de antigénios HLA classe II DQ2 ou DQ8.
Trata-se de uma doença bem mais frequente do que habitualmente julgado, com sintomas e sinais não só gastrointestinais mas também multissistémicos que podem vir a surgir apenas na idade adulta, motivo que justifica a apresentação deste pequeno artigo de revisão clínica.
Trata-se de uma doença bem mais frequente do que habitualmente julgado, com sintomas e sinais não só gastrointestinais mas também multissistémicos que podem vir a surgir apenas na idade adulta, motivo que justifica a apresentação deste pequeno artigo de revisão clínica.
Epidemiologia da doença celíaca
Contrariamente ao que se pensava até há poucos anos, a doença celíaca é comum. A convicção de ser uma doença rara deve-se ao elevado número de doentes assintomáticos ou com sintomas gastrointestinais ligeiros e subvalorizados. O desenvolvimento de testes serológicos com elevadas especificidade e sensibilidade permitiu a identificação destes doentes. Estudos populacionais indicam que aproximadamente 0.5 a 1 por cento das populações da Europa Ocidental e da América do Norte têm DC. Afecta crianças e adultos e há uma predominância do sexo feminino (2-3:1) até aos 65 anos, idade a partir da qual a proporção é igual em ambos os sexos.
Contrariamente ao que se pensava até há poucos anos, a doença celíaca é comum. A convicção de ser uma doença rara deve-se ao elevado número de doentes assintomáticos ou com sintomas gastrointestinais ligeiros e subvalorizados. O desenvolvimento de testes serológicos com elevadas especificidade e sensibilidade permitiu a identificação destes doentes. Estudos populacionais indicam que aproximadamente 0.5 a 1 por cento das populações da Europa Ocidental e da América do Norte têm DC. Afecta crianças e adultos e há uma predominância do sexo feminino (2-3:1) até aos 65 anos, idade a partir da qual a proporção é igual em ambos os sexos.
Patogenia da doença celíaca
A doença celíaca é provocada pela ingestão da gliadina, uma proteína do glúten presente em alimentos que contenham trigo, cevada e centeio. Nos indivíduos com DC, a integridade do epitélio intestinal está comprometida, permitindo a passagem dos péptidos de gliadina. Estes vão ser modificados pela enzima transglutaminase tecidular localizada no espaço extracelular da mucosa intestinal, podendo dessa forma ligar-se aos antigénios de classe II DQ2 ou DQ8, desencadeando uma resposta imunitária. Contudo, cerca de 25-30 por cento da população do hemisfério Ocidental expressa estes alelos e apenas uma minoria desenvolve DC numa dieta com glúten. Outros factores, fora do âmbito deste artigo, estão envolvidos na patogenia da doença.
Manifestações clínicas da doença celíaca
A clínica é variada e multissistémica, podendo surgir em qualquer idade .
As formas clássicas de DC na criança manifestam-se com sintomas gastrointestinais que começam entre os 6 e os 24 meses, após a introdução do glúten na dieta. Geralmente, há um quadro de diarreia, distensão abdominal e atraso de crescimento.
Porém, vómitos, irritabilidade, anorexia e obstipação também são comuns.
No adulto, a apresentação clássica consiste num quadro de diarreia. No entanto, na última década, esta tem sido o sintoma principal em menos de 50 por cento dos casos diagnosticados.
Podem existir outras manifestações gastrointestinais, nomeadamente dor abdominal (prevalência de 34 a 64 por cento), distensão abdominal (33 por cento), flatulência (28 por cento), obstipação (3 a 12 por cento), vómitos (5 a 16 por cento), náuseas (4 por cento).
De facto, a maioria dos celíacos, especialmente os adultos, não apresenta queixas gastrointestinais, tendo antes manifestações resultantes da má absorção ou outros sintomas e sinais sistémicos de causa variada.
A anemia ferropénica é comum (10 a 15 por cento) e pode ser o único sinal da doença celíaca .
É importante pensar na DC quando não há causa aparente para a anemia. Outros exemplos de manifestações extra-intestinais são fadiga (78 a 80 por cento), perda de peso (45 por cento), embora a presença de obesidade não exclua o diagnóstico, anorexia, osteopenia e osteoporose (1 a 34 por cento).
Pode ainda estar associada a elevação crónica não específica dos valores séricos das aminotransferases (2 a 19 por cento), não explicada por outra etiologia, com valores de AST compreendidos entre 29 e 80 U/L e de ALT entre 60 a 130 U/L, sendo geralmente a ALT superior à AST.
Outras manifestações, como depressão (10,6 por cento), epilepsia (3,5 por cento), enxaqueca (3,2 por cento), ansiedade (2,6 por cento) e miopatia (1,5 por cento) têm sido descritas em indivíduos com doença celíaca.
A intolerância ao glúten também pode manifestar-se como uma doença da pele (dermatite herpetiforme). Estes doentes apresentam anticorpos anti-tTG e alterações histológicas da mucosa intestinal próprias de DC.
Os indivíduos com dermatite herpetiforme, doenças auto-imunes da tiróide, diabetes mellitus tipo 1, deficiência selectiva da IgA, síndroma de Down, síndroma de Turner e os familiares de primeiro grau de doentes celíacos têm um risco superior ao da população geral de desenvolver DC. Isto é verdade particularmente para a dermatite herpetiforme, na qual a prevalência de DC chega aos 85 por cento.
Não é recomendado o rastreio da população geral, mas, nos doentes que pertencem a estes grupos de risco, é aconselhável a realização de testes serológicos, mesmo na ausência de sintomas.
O rastreio dos doentes com osteoporose, sem outra sintomatologia, também não é recomendado, dado que não existe um aumento significativo da prevalência de DC na população com osteoporose .
A clínica é variada e multissistémica, podendo surgir em qualquer idade .
As formas clássicas de DC na criança manifestam-se com sintomas gastrointestinais que começam entre os 6 e os 24 meses, após a introdução do glúten na dieta. Geralmente, há um quadro de diarreia, distensão abdominal e atraso de crescimento.
Porém, vómitos, irritabilidade, anorexia e obstipação também são comuns.
No adulto, a apresentação clássica consiste num quadro de diarreia. No entanto, na última década, esta tem sido o sintoma principal em menos de 50 por cento dos casos diagnosticados.
Podem existir outras manifestações gastrointestinais, nomeadamente dor abdominal (prevalência de 34 a 64 por cento), distensão abdominal (33 por cento), flatulência (28 por cento), obstipação (3 a 12 por cento), vómitos (5 a 16 por cento), náuseas (4 por cento).
De facto, a maioria dos celíacos, especialmente os adultos, não apresenta queixas gastrointestinais, tendo antes manifestações resultantes da má absorção ou outros sintomas e sinais sistémicos de causa variada.
A anemia ferropénica é comum (10 a 15 por cento) e pode ser o único sinal da doença celíaca .
É importante pensar na DC quando não há causa aparente para a anemia. Outros exemplos de manifestações extra-intestinais são fadiga (78 a 80 por cento), perda de peso (45 por cento), embora a presença de obesidade não exclua o diagnóstico, anorexia, osteopenia e osteoporose (1 a 34 por cento).
Pode ainda estar associada a elevação crónica não específica dos valores séricos das aminotransferases (2 a 19 por cento), não explicada por outra etiologia, com valores de AST compreendidos entre 29 e 80 U/L e de ALT entre 60 a 130 U/L, sendo geralmente a ALT superior à AST.
Outras manifestações, como depressão (10,6 por cento), epilepsia (3,5 por cento), enxaqueca (3,2 por cento), ansiedade (2,6 por cento) e miopatia (1,5 por cento) têm sido descritas em indivíduos com doença celíaca.
A intolerância ao glúten também pode manifestar-se como uma doença da pele (dermatite herpetiforme). Estes doentes apresentam anticorpos anti-tTG e alterações histológicas da mucosa intestinal próprias de DC.
Os indivíduos com dermatite herpetiforme, doenças auto-imunes da tiróide, diabetes mellitus tipo 1, deficiência selectiva da IgA, síndroma de Down, síndroma de Turner e os familiares de primeiro grau de doentes celíacos têm um risco superior ao da população geral de desenvolver DC. Isto é verdade particularmente para a dermatite herpetiforme, na qual a prevalência de DC chega aos 85 por cento.
Não é recomendado o rastreio da população geral, mas, nos doentes que pertencem a estes grupos de risco, é aconselhável a realização de testes serológicos, mesmo na ausência de sintomas.
O rastreio dos doentes com osteoporose, sem outra sintomatologia, também não é recomendado, dado que não existe um aumento significativo da prevalência de DC na população com osteoporose .
Diagnóstico da doença celíaca
Todos os testes diagnósticos necessitam de ser efectuados na presença de uma dieta que contenha glúten, uma vez que iniciada a dieta os testes podem tornar-se normais.
O primeiro passo consiste na realização de testes serológicos. Os marcadores serológicos da doença são os anticorpos da classe IgA anti-endomísio (EMA) e anti-transglutaminase tecidular (tTG), sendo o primeiro o mais específico e o último o mais sensível.
O uso dos anticorpos antigliadina (AGA), IgA e IgG não é recomendado como rotina para a detecção da DC, devido às suas baixas especificidade e sensibilidade.
Actualmente, a determinação dos anticorpos IgA anti-tTG (mais fáceis de realizar e mais baratos) é a melhor ferramenta serológica para o rastreio dos doentes celíacos.
Um algoritmo diagnóstico possível envolve a utilização dos anticorpos IgA anti-tTG que, quando positivos, devem ser confirmados com a pesquisa de EMA.
Contudo, foi desenvolvido um teste de AGA de segunda geração (AGA II) com elevada especificidade (99 por cento) e sensibilidade (94 por cento), podendo a combinação deste teste com os anticorpos anti-tTG tornar-se uma dupla poderosa de diagnóstico serológico. Os AGA II também podem ser utilizados na pesquisa de DC em idade pediátrica, pois os autoanticorpos anti-tTG só costumam aparecer após os 2-5 anos de idade.
O teste IgA anti-tTG não deve ser usado em doentes com deficiência de IgA, que muitas vezes coexiste nos doentes celíacos, devendo nesses casos ser efectuado o doseamento sérico de IgA e pesquisa de IgG anti-tTG e IgG AGA II.
O segundo passo consiste na realização de uma biopsia duodenal, sendo características a linfocitose intra-epitelial, a hiperplasia das criptas e a atrofia das vilosidades.
A confirmação do diagnóstico serológico da DC requer sempre biopsia de vários fragmentos da segunda e terceira porção do duodeno constituindo, como única excepção, os doentes com dermatite herpetiforme demonstrada em biopsia de pele.
Havendo concordância entre serologia e histologia temos um diagnóstico presuntivo, sendo definitivo quando há resolução dos sintomas após retirar totalmente o glúten da dieta.
Alguns indivíduos são positivos nos testes serológicos, mas não apresentam alterações histológicas. Estes casos são classificados como DC latente e devem ser vigiados a longo prazo, para detecção de sintomatologia ou alterações sugestivas, pois foi demonstrado que a detecção de anticorpos pode preceder, em muitos anos, o aparecimento da sintomatologia.
Todos os testes diagnósticos necessitam de ser efectuados na presença de uma dieta que contenha glúten, uma vez que iniciada a dieta os testes podem tornar-se normais.
O primeiro passo consiste na realização de testes serológicos. Os marcadores serológicos da doença são os anticorpos da classe IgA anti-endomísio (EMA) e anti-transglutaminase tecidular (tTG), sendo o primeiro o mais específico e o último o mais sensível.
O uso dos anticorpos antigliadina (AGA), IgA e IgG não é recomendado como rotina para a detecção da DC, devido às suas baixas especificidade e sensibilidade.
Actualmente, a determinação dos anticorpos IgA anti-tTG (mais fáceis de realizar e mais baratos) é a melhor ferramenta serológica para o rastreio dos doentes celíacos.
Um algoritmo diagnóstico possível envolve a utilização dos anticorpos IgA anti-tTG que, quando positivos, devem ser confirmados com a pesquisa de EMA.
Contudo, foi desenvolvido um teste de AGA de segunda geração (AGA II) com elevada especificidade (99 por cento) e sensibilidade (94 por cento), podendo a combinação deste teste com os anticorpos anti-tTG tornar-se uma dupla poderosa de diagnóstico serológico. Os AGA II também podem ser utilizados na pesquisa de DC em idade pediátrica, pois os autoanticorpos anti-tTG só costumam aparecer após os 2-5 anos de idade.
O teste IgA anti-tTG não deve ser usado em doentes com deficiência de IgA, que muitas vezes coexiste nos doentes celíacos, devendo nesses casos ser efectuado o doseamento sérico de IgA e pesquisa de IgG anti-tTG e IgG AGA II.
O segundo passo consiste na realização de uma biopsia duodenal, sendo características a linfocitose intra-epitelial, a hiperplasia das criptas e a atrofia das vilosidades.
A confirmação do diagnóstico serológico da DC requer sempre biopsia de vários fragmentos da segunda e terceira porção do duodeno constituindo, como única excepção, os doentes com dermatite herpetiforme demonstrada em biopsia de pele.
Havendo concordância entre serologia e histologia temos um diagnóstico presuntivo, sendo definitivo quando há resolução dos sintomas após retirar totalmente o glúten da dieta.
Alguns indivíduos são positivos nos testes serológicos, mas não apresentam alterações histológicas. Estes casos são classificados como DC latente e devem ser vigiados a longo prazo, para detecção de sintomatologia ou alterações sugestivas, pois foi demonstrado que a detecção de anticorpos pode preceder, em muitos anos, o aparecimento da sintomatologia.
Tratamento da doença celíaca
A chave para o tratamento da DC consiste numa dieta sem glúten, na qual todos os alimentos que contêm trigo, cevada e centeio devem ser excluídos . Mesmo pequenas quantidades de glúten podem ser nocivas pelo que, estando presente num elevado número de alimentos, a dieta s torna particularmente difícil. De facto, a não adesão estrita à dieta constitui o factor mais frequente de ausência de melhoria.
Estão preconizados seis elementos-chave no tratamento destes doentes, representados pela sigla:
Consulta de um dietista especializado
Educação dos doentes
Lifelong – adesão a uma dieta sem glúten durante toda a vida
Identificação e tratamento de défices nutricionais
Aceder a um grupo de apoio
Continuar a ser vigiado a longo prazo por uma equipa multidisciplinar
A resposta à privação do glúten é geralmente rápida, com uma melhoria dos sintomas gastrointestinais passadas duas a três semanas. Quando os celíacos cumprem a dieta, a arquitectura intestinal é restaurada e, no caso dos doentes com dermatite herpetiforme, as lesões cutâneas desaparecem.
A ausência de melhoria após seis a oito semanas de dieta deve sugerir o seu incumprimento ou uma doença associada.
Os anticorpos anti-tTG diminuem e eventualmente desaparecem após 3 a 12 meses de dieta sem glúten. Isso permite que este anticorpo possa ser usado para monitorizar a adesão dos doentes à dieta, embora a sua normalização não apresente relação com a melhoria histológica.
Estão preconizados seis elementos-chave no tratamento destes doentes, representados pela sigla:
Consulta de um dietista especializado
Educação dos doentes
Lifelong – adesão a uma dieta sem glúten durante toda a vida
Identificação e tratamento de défices nutricionais
Aceder a um grupo de apoio
Continuar a ser vigiado a longo prazo por uma equipa multidisciplinar
A resposta à privação do glúten é geralmente rápida, com uma melhoria dos sintomas gastrointestinais passadas duas a três semanas. Quando os celíacos cumprem a dieta, a arquitectura intestinal é restaurada e, no caso dos doentes com dermatite herpetiforme, as lesões cutâneas desaparecem.
A ausência de melhoria após seis a oito semanas de dieta deve sugerir o seu incumprimento ou uma doença associada.
Os anticorpos anti-tTG diminuem e eventualmente desaparecem após 3 a 12 meses de dieta sem glúten. Isso permite que este anticorpo possa ser usado para monitorizar a adesão dos doentes à dieta, embora a sua normalização não apresente relação com a melhoria histológica.
Complicações da doença celíaca
O diagnóstico precoce da DC na criança é muito importante porque a doença pode originar atrasos no crescimento e desenvolvimento. No entanto, tal como exposto, a DC também afecta adultos que podem apresentar uma redução substancial da qualidade de vida, risco aumentado de osteoporose, de doenças auto-imunes e até de neoplasias. Estas últimas ocorrem tipicamente após muitos anos de evolução, como é o caso do adenocarcinoma do intestino delgado e do linfoma de células T associado a enteropatia.
É ainda descrita a DC refractária, que consiste na persistência dos sintomas e da inflamação intestinal, apesar da exclusão total do glúten da dieta. Pode ocorrer no contexto de jejunite ulcerativa ou pode ser uma manifestação precoce do linfoma intestinal.
É ainda descrita a DC refractária, que consiste na persistência dos sintomas e da inflamação intestinal, apesar da exclusão total do glúten da dieta. Pode ocorrer no contexto de jejunite ulcerativa ou pode ser uma manifestação precoce do linfoma intestinal.
Comentários
Postar um comentário