Sensibilidade ao glúten tem novas explicações

Proteínas e carboidratos do trigo podem induzir respostas do sistema imune inato .



 Por Julianne Wyrick

‘Você é a enfermeira? Mas você é tão jovem... – perguntei à minha mãe, enquanto voltava lentamente de minha sonolência induzida por anestesia. Aparentemente eu não estava consciente o bastante para saber quem era ela (por sorte, fui bem educada) depois da endoscopia. Depois de amostrar o tecido intestinal, ele poderia me dizer se eu tinha doença celíaca, uma doença autoimune em que alimentos contendo glúten provocam a destruição da forragem interna do intestino delgado.

Logo o diagnóstico chegou: negativo. Meu médico explicou que, em vez da doença celíaca, uma “sensibilidade ao glúten” era provavelmente a causa do inchaço e dor abdominal que eu vinha sentindo. Se eu removesse ou diminuísse o glúten na minha dieta, provavelmente poderia reduzir meus sintomas. Foi isso que eu fiz. E na maior parte do tempo, ficar longe do glúten afastou o desconforto.

Mas por fim minha formação científica prevaleceu. Precisei saber o que realmente estava acontecendo em meu corpo. O que “sensibilidade ao glúten” realmente significa?

Infelizmente, não existe resposta fácil. Quando pacientes sem doença celíaca exibem sintomas que melhoram com uma dieta livre de glúten, eles são frequentemente classificados como “sensíveis ao glúten”. Esses sintomas podem ir de dores abdominais a inchaço e fatiga.

No passado, a própria existência da doença foi questionada devido a seu diagnóstico incerto. No entanto, como aponta o
 New York Times, novos estudos sugerem que a sensibilidade ao glúten existe de fato.

O que isso e outros artigos recentes não mencionaram é que pesquisadores tiveram algumas ideias interessantes sobre seu funcionamento. Também descobriram que a chamada “sensibilidade ao glúten” pode não ser provocada pelo glúten afinal.

Para entender novas pesquisas sobre a sensibilidade ao glúten, primeiro é importante entender as duas outras doenças induzidas pelo glúten: a doença celíaca e a alergia ao trigo. As duas doenças envolvem o sistema imune.

Na doença celíaca, a presença de glúten no intestino delgado dispara uma resposta do sistema imune adaptativo, a parte do sistema imune que reage a invasores específicos com a produção de anticorpos. A reação imune indesejada acaba levando o corpo a atacar seus próprio enterócitos saudáveis, ou células que forram o intestino delgado.

Um das razões para a ocorrência dessa resposta indesejada é que indivíduos com doença celíaca têm um “intestino que vaza” [
leaky gut]. O revestimento do intestino delgado normalmente é revestido de enterócitos “colados” uns aos outros por junções firmes. Em pessoas com doença celíaca, a adesão não se sustenta. Fragmentos de glúten podem escapar por essas lacunas e provocar uma resposta imune adaptativa que danifica o tecido intestinal (o mecanismo completo é descrito em grande detalhe neste artigo de 2009 da Scientific Americanhttp://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=celiac-disease-insights).

O segundo tipo de doença induzida por glúten, a alergia ao trigo, também é mediada em parte pelo sistema imunológico adaptativo. Nessa doença, o glúten induz a síntese de anticorpos IgE que provocam uma inflamação. A inflamação pode provocar desconforto local e danos a tecidos saudáveis.

Pessoas com “sensibilidade ao glúten”, por outro lado, não apresentam evidências para o tipo de reações imunes que ocorrem em pessoas com doença celíaca ou alergia ao trigo.

Então o que está provocando a sensibilidade ao glúten? Algumas pesquisas recentes sugerem que o problema ainda está no sistema imune. No entanto, em vez de ser provocada pela porção adaptativa, acredita-se que está associada ao sistema imune inato.

Se o sistema imune adaptativo é um alfaiate que desenha jaquetas personalizadas, o sistema imune inato usa ponchos de tamanho único. Em vez de produzir anticorpos que reconhecem invasores específicos, células do sistema imune inato têm receptores conhecidos como TLRs que reconhecem grandes padrões presentes em grande variedade de invasores. Então, os TLRs disparam uma resposta inflamatória rápida.

Um estudo de 2011 descobriu que pacientes sensíveis ao glúten tem maior expressão dos TLRs se comparados a pacientes do grupo de controle. Essa descoberta sugere o envolvimento do sistema imune inato. Além disso, o estudo apoiou a ideia de que o sistema imune adaptativo não está envolvido na “sensibilidade ao glúten”. Enterócitos de pacientes sensíveis ao glúten ficam fortemente aderidos, ao contrário dos pacientes com doença celíaca. Como resultado, fragmentos de glúten não conseguem passar entre as células para ativar o sistema imune adaptativo.

Mas será que essa resposta imune é realmente provocada pelo glúten? Dados de outro estudo publicado em dezembro sugerem que uma família de proteínas do trigo pode ser a responsável. As proteínas, inibidores de amilase-tripsina, ou ATIs, ativaram um tipo de TLR e provocaram uma resposta imune inata em células do sistema imune humano e em ratos vivos.

Interessantemente, a quantidade de ATI no trigo sofreu um aumento dramático em anos recentes. Proteínas ATI naturalmente protegem o trigo de pragas. Como o trigo é produzido para ser cada vez mais resistente a pragas, a quantidade de ATI também aumenta. Um aumento em ATIs pode explicar o que parece ser uma quantidade cada vez maior de pessoas sensíveis ao glúten.

ATIs não são as únicas moléculas não-glúten acusada de estar por trás da chamada “sensibilidade ao glúten”. Carboidratos do trigo, conhecidos como FODMAPs, também foram implicados. Essas moléculas, no entanto, não provocam desconforto abdominal e outros sintomas devido a uma resposta imune. Em vez disso, a natureza não-digerível desses carboidratos pode provocar retenção hídrica e produção de gás no intestino delgado, levando a inchaços.

Ainda que tenhamos feito algum progresso para uma melhor compreensão do que pode provocar a “sensibilidade ao glúten”, ainda restam muitas perguntas. Nesse meio tempo, para quem recebeu a recomendação médica de uma dieta sem glúten, haverá muitos alimentos para escolher, já que o mercado sem glúten continua a crescer. 
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‘Você é a enfermeira? Mas você é tão jovem... – perguntei à minha mãe, enquanto voltava lentamente de minha sonolência induzida por anestesia. Aparentemente eu não estava consciente o bastante para saber quem era ela (por sorte, fui bem educada) depois da endoscopia. Depois de amostrar o tecido intestinal, ele poderia me dizer se eu tinha doença celíaca, uma doença autoimune em que alimentos contendo glúten provocam a destruição da forragem interna do intestino delgado.

Logo o diagnóstico chegou: negativo. Meu médico explicou que, em vez da doença celíaca, uma “sensibilidade ao glúten” era provavelmente a causa do inchaço e dor abdominal que eu vinha sentindo. Se eu removesse ou diminuísse o glúten na minha dieta, provavelmente poderia reduzir meus sintomas. Foi isso que eu fiz. E na maior parte do tempo, ficar longe do glúten afastou o desconforto.

Mas por fim minha formação científica prevaleceu. Precisei saber o que realmente estava acontecendo em meu corpo. O que “sensibilidade ao glúten” realmente significa?

Infelizmente, não existe resposta fácil. Quando pacientes sem doença celíaca exibem sintomas que melhoram com uma dieta livre de glúten, eles são frequentemente classificados como “sensíveis ao glúten”. Esses sintomas podem ir de dores abdominais a inchaço e fatiga.

No passado, a própria existência da doença foi questionada devido a seu diagnóstico incerto. No entanto, como aponta o
 New York Times, novos estudos sugerem que a sensibilidade ao glúten existe de fato.

O que isso e outros artigos recentes não mencionaram é que pesquisadores tiveram algumas ideias interessantes sobre seu funcionamento. Também descobriram que a chamada “sensibilidade ao glúten” pode não ser provocada pelo glúten afinal.

Para entender novas pesquisas sobre a sensibilidade ao glúten, primeiro é importante entender as duas outras doenças induzidas pelo glúten: a doença celíaca e a alergia ao trigo. As duas doenças envolvem o sistema imune.

Na doença celíaca, a presença de glúten no intestino delgado dispara uma resposta do sistema imune adaptativo, a parte do sistema imune que reage a invasores específicos com a produção de anticorpos. A reação imune indesejada acaba levando o corpo a atacar seus próprio enterócitos saudáveis, ou células que forram o intestino delgado.

Um das razões para a ocorrência dessa resposta indesejada é que indivíduos com doença celíaca têm um “intestino que vaza” [
leaky gut]. O revestimento do intestino delgado normalmente é revestido de enterócitos “colados” uns aos outros por junções firmes. Em pessoas com doença celíaca, a adesão não se sustenta. Fragmentos de glúten podem escapar por essas lacunas e provocar uma resposta imune adaptativa que danifica o tecido intestinal (o mecanismo completo é descrito em grande detalhe neste artigo de 2009 da Scientific Americanhttp://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=celiac-disease-insights).

O segundo tipo de doença induzida por glúten, a alergia ao trigo, também é mediada em parte pelo sistema imunológico adaptativo. Nessa doença, o glúten induz a síntese de anticorpos IgE que provocam uma inflamação. A inflamação pode provocar desconforto local e danos a tecidos saudáveis.

Pessoas com “sensibilidade ao glúten”, por outro lado, não apresentam evidências para o tipo de reações imunes que ocorrem em pessoas com doença celíaca ou alergia ao trigo.

Então o que está provocando a sensibilidade ao glúten? Algumas pesquisas recentes sugerem que o problema ainda está no sistema imune. No entanto, em vez de ser provocada pela porção adaptativa, acredita-se que está associada ao sistema imune inato.

Se o sistema imune adaptativo é um alfaiate que desenha jaquetas personalizadas, o sistema imune inato usa ponchos de tamanho único. Em vez de produzir anticorpos que reconhecem invasores específicos, células do sistema imune inato têm receptores conhecidos como TLRs que reconhecem grandes padrões presentes em grande variedade de invasores. Então, os TLRs disparam uma resposta inflamatória rápida.

Um estudo de 2011 descobriu que pacientes sensíveis ao glúten tem maior expressão dos TLRs se comparados a pacientes do grupo de controle. Essa descoberta sugere o envolvimento do sistema imune inato. Além disso, o estudo apoiou a ideia de que o sistema imune adaptativo não está envolvido na “sensibilidade ao glúten”. Enterócitos de pacientes sensíveis ao glúten ficam fortemente aderidos, ao contrário dos pacientes com doença celíaca. Como resultado, fragmentos de glúten não conseguem passar entre as células para ativar o sistema imune adaptativo.

Mas será que essa resposta imune é realmente provocada pelo glúten? Dados de outro estudo publicado em dezembro sugerem que uma família de proteínas do trigo pode ser a responsável. As proteínas, inibidores de amilase-tripsina, ou ATIs, ativaram um tipo de TLR e provocaram uma resposta imune inata em células do sistema imune humano e em ratos vivos.

Interessantemente, a quantidade de ATI no trigo sofreu um aumento dramático em anos recentes. Proteínas ATI naturalmente protegem o trigo de pragas. Como o trigo é produzido para ser cada vez mais resistente a pragas, a quantidade de ATI também aumenta. Um aumento em ATIs pode explicar o que parece ser uma quantidade cada vez maior de pessoas sensíveis ao glúten.

ATIs não são as únicas moléculas não-glúten acusada de estar por trás da chamada “sensibilidade ao glúten”. Carboidratos do trigo, conhecidos como FODMAPs, também foram implicados. Essas moléculas, no entanto, não provocam desconforto abdominal e outros sintomas devido a uma resposta imune. Em vez disso, a natureza não-digerível desses carboidratos pode provocar retenção hídrica e produção de gás no intestino delgado, levando a inchaços.

Ainda que tenhamos feito algum progresso para uma melhor compreensão do que pode provocar a “sensibilidade ao glúten”, ainda restam muitas perguntas. Nesse meio tempo, para quem recebeu a recomendação médica de uma dieta sem glúten, haverá muitos alimentos para escolher, já que o mercado sem glúten continua a crescer. 

 http://www2.uol.com.br/sciam/noticias/sensibilidade_ao_gluten_tem_novas_explicacoes.html

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